segunda-feira, 12 de novembro de 2007

Desconhecidos

Este post é parelelo! O seu reverso está em Dedos Livres.

Embora custume andar na rua com a cabeça a vaguear por pensamentos, várias vezes são as ocasiões que a palavra "desconhecido" tem significado. É comum ir aqui em Carnide, e as pessoas mais idosas passarem por mim, fazerem um sorriso e dizerem: "Boa tarde!". Eu sorrio. São desconhecidas, embora quase que saiba o porquê do "Boa tarde!".

É comum desviar-me desses pensamentos e prestar atenção a quem passa. Por mera curiosidade, várias feições revelam diferentes sentimentos. Olhares distantes, cabisbaixos, apressados, tudo.

18:30. Depois de ter estado no Gregoriano, apanhei o metro em Entre-Campos para o Marquês de Pombal. Cansado, tive a sorte de, no Marques, ter apanhado um Metro com lugares livres. Sentei-me. Ao meu lado estava um senhor que jogava freneticamente GameBoy, enquanto falava ao telefone. Olhei melhor para ele e reparei que obviamente era alguem que tinha crescido, agarrado ainda aos belos prazeres da infância.
Voltei a vaguear na minha cabeça, com o olhar fixado no painel que diz: "Proxima estação:...". Por momentos, desviei o olhar e reparei que a senhora que estava sentada do lado oposto ao meu tinha a cara toda vermelha. Talvez não me tivesse apercebido melhor da situação, caso ela não estivesse a chorar compulsivamente. Encolhida sobre si, enconstada o máximo possivel à janela, as lágrimas corriam sem parar. Tentava controlar os soluços, mas não consiga. Fazia impressao.
A palavra "desconhecido" ganhava, então, um novo significado. As pessoas que estavam nesse Metro aperceberam-se da situação, e notava-se um certo clima de "Quero ajudar, mas nao posso". Não? Não. Porque era desconhecida. Porque nada ligava essa senhora a quem estava no Metro, e ninguem se queria intrometer. Chorava, era claro que precisava de alguem que lhe dissesse "Está tudo bem.". Mas ninguem o podia fazer.
Retirei o meu olhar incrédulo, que durou meio segundo, de volta ao painel da "Proxima estação...". E quando sai em Carnide, ela ainda lá estava. A chorar. E percebia-se que era uma dor que destruia-lhe tudo o que tinha dentro de si.

Fui para casa a perguntar-me se devia ter dito alguma coisa. Mas o que? Que poderia eu ter dito? "Ora, não chore, a vida continua", parecia-me tao absurdo que quase me ri so de pensar nesta frase. Era impossivel dizer alguma coisa. Fica a intenção. Porque eramos todos, todos aqueles que estavam no Metro nesse momento, uns meros desconhecidos.

5 comentários:

Tiago Krug disse...

Quem é que não passou já por situações dessas?
Lembro de ver uma vez uma rapariga a chorar desmedidamente também, e de uma senhora muito carregada que quase não conseguia com o quadro que tinha na mão e tinha de o levar para uma loja no Colombo.
De ambas as vezes fiquei parado a pensar que lhes queria falar, mas também não o fiz.
De ambas, arrependi-me!
Porque, no meu ver, não temos de passar a vida a correr uns pelos outros sem nos tocarmos. O que dá sentido à vida é as alturas em que nos permitimos fazê-lo.
Uns tornam-se amigos, pessoas com quem partilhamos os dias. Outros permanecem apenas naquele momento, mas vazem parte das histórias da nossa história.
São como a pontuação entre as palavras do texto, como o cimento entre os tijolos, são a coerencia da forma como vivemos.
Porque viver apenas para quem nos conhece e não é desconhecido que sentido tem?
Por outro lado, relembro com um sorriso das senhoras com quem falei no autocarro, naquelas que ajudei a subir escadas sem corrimão, nos senhores que presisavam de ajuda para se orientar e tanto mais.
Ser desconhecido, não é ser ninguém... =)

Anónimo disse...

Xi, o meu caso tambem foi super mau:

Ha 2 anos fui estudar po jardim da Luz pois em csa nao havia condiçoes.
A certa altura ta 1 criança a correr e cai mesmo à minha frente...E eu ali parada a pensar: "Pronto, va la q foi ligeiro, levanta-te va, nem tas a chorar nem nd, é pk nao doeu...ela vai s levantar,...certo?...

Fiquei ali especada a olha-a fixamente, sem reacção...Vou levanta-la? Nao vou? =S

Fg, senti-me tao mal -.-

Cacao disse...

ena, tou com pele de galinha. e tu, tiago, também ajudaste!

De facto pergunto-me o qe teria feito. Aida não tive acontecimentos tão inéditos no metro, mesmo que ande muito "disso". As coisas que me lembro de ter feito no metro é de ajudar uma grávida a fazer qq coisa, apanhar o papel da senhora que o deixou cair, e coisas peqeninas. Mas, se visse essa senhora a chorar, ter-lhe-ia dito alguma coisa? Agora que penso bem, acho que não. Limitarme-ia a sorrir-lhe com um sorriso profundo e consolador. E é isso que faço muias vezes aos desconhecidos. E é dos desconhecidos que agradeço os sorrisos, quando bem preciso.

Por isso a todos aconselho:
Andem por aí a espalhar sorrisos.
Por esse mundo desconhecido fora.!

Anónimo disse...

e o mais engraçado no meio disto tudo, é que alguém o relata num blog e tem como resposta muitos que passaram pelo mesmo... ou seja, aflitivamente, todos os "passageiros" daquele e doutros "metros" vão para casa a pensar do que poderiam ter feito.. não deveriamos ousar mais? porque digo então ousar, e não agir naturalmente? Porque não agimos naturalmente já que o nosso instinto nos diz que podemos fazer mais? O que nos impede?... Temos muito medo que, invadindo uma aparente privacidade, sejamos de imediato atacados na nossa...

Anabela disse...

Sim, concordo contigo, anónimo! Provavelmente temos medo de sermos expostos por alguma razão ou reacção que possa derivar do nosso gesto! Mas se nos arrependemos de não fazer alguma coisa que isso sirva de "aviso" ou #ensaio" para a próxima vez! Claro que às vezes,quem é o desconhecido a chorar, por exemplo, gostaria de estar consigo mesmo a destilar as mágoas sozinho,... mas uma pista para quem "assiste" é seguir a intuição, que é para isso que ela existe! Sim, respondermos ao nosso 6º sentido, mais do que "fazer o que gostariamos que nos fizessem".