Gosto de ver com os meus próprios olhos aquilo a que eu chamo "obras de Deus". São raras as vezes, mas as suficientes para eu perceber o quão fantasticas sao. Ja tive momentos em que me olhei como uma, sem egocentrismo ou convencimento, momentos esses em que estive perto do tal paraíso.
Ontem fui convidado a ir tocar a um casamento na Ericeira, mais Ele e Ela, que iriam cantar, ambos do Instituto Gregoriano. Entao, por volta da duas da tarde, la fui no carro vermelho, um Mini moderno, que bem aguentou a pedalada que Ela lhe imprima. Fui no banco de trás, a viagem prometia ser divertida, e foi. Ao ponto de nos enganarmos nas tabuletas, e chegarmos a Óbidos (ainda vimos ao longe o castelo de Óbidos), porque nao tinhamos visto o sinal a dizer: "Mafra Malveira". Enfim...
O casamento correu bem, é sempre interessante ver o nervosismo do noivo, e o momento da chegada da noiva. E ontem foi especial, porque segundo o padre, a noiva sempre teve o sonho, desde pequenina, de entrar no seu casamento ao som da Ave Maria de Schubert. E eu, ao tocar, senti-me ajudante dessa concretização.
Na viagem para cá vinhamos mais cansados. Ja nao havia musicas para aprender, ja nao nos apetecia cantar, entao viemos a conversar.
Por meio de conversas mais sérias, Ela olhou-me pelo retrovisor, e disse: "Algo que eu acho fenomenal é a maneira como voces" (eu e Ele) "se entregam às pessoas e às coisas que se envolvem.".. "é lindo!". Ele suspirou, eu tambem. E Ela continou, como se Ele nao tivesse ali: "O problema d'Ele é que, sendo tao humilde, caiu nas maos da pessoa errada.", e dito isto, logo lhe agarrou a mao. Suspirei outra vez. Disso eu estava certo que nao me tinha acontecido. Caido nas maos da pessoa errada? Bem pelo contrário. Por momentos senti mais que eu é que era a pessoa errada no meio da confusão.
A viagem continuou. Nalguns momentos de silêncio, olhei para eles os dois, para a sua simplicidade. Ele passara o ano todo em baixo. O verão passado foi vivido em sofrimento, o qual testemunhei com a dor de um amigo. Mas como agora lhe digo, ha males que veem por bem. E a alegria que Ele agora tem, faz-nos (a nós, familia Gregoriano) crer que está entregue a que sempre lhe foi destinado. Porque? Nao sei. Há aquelas coisas que nos nao sabemos explicar porque, mas sabemos que assim são. E tambem porque gostamos sempre de ter casais que sejam "lá da casa"!
Já em Carnide, pedi-lhe para me deixar na Quinta da Luz. Ao passar em frente ao Teatro, o sinal ficou vermelho. Parou ao lado da Igreja. A conversa ja tinha acabado. E de repente, Ela olhou-o nos olhos, e disse A frase. Fiquei estupefacto, mais parecia estar sentado a ver um filme.. mas a sério. E sentado no banco de trás, continuava embasbacado a olhar para aquilo. Soltei um "Ai mae..". Estupefacto e embasbacado porque ha frase foi dita de Tal maneira, com Tal olhar e com Tal sorriso, que era certo: são Obras de Deus. Talvez se tivessem feito daquele momento um filme, com uma musica romantica e suave, milhares de pessoas estariam a chorar. E eu assisti aquilo, sozinho, no banco de trás. E outro suspiro lancei. O terceiro desse dia. Perante tal espanto, Ela olhou para trás, e disse-me: "Vá, eu nao digo muitas destas, mas quando digo, gosto de dize-las!". E enquanto escrevo isto, ainda paro, a pensar nesse momento.
Depois de tal espanto, olhei para a Igreja. Sempre tive o sonho de tocar a Marcha Nupcial e mal a noiva estivesse perto do altar, eu fazia slide de onde está o orgao (em cima da entrada), e descer ate ao altar. Chamar-me-iam de louco. Eu apenas acho que é a minha maneira de ser. (Embora ninguem aprove a ideia..!)
Quando me deixaram na Quinta da Luz, nao pude deixar de lhes dizer obrigado. E quando me dirigi para frente daquela Janela, senti que era altura de trasnformar outra coisa em Obra de Deus. Peguei no telemovel. Nao desisto. Sei que
Ele nao quer isso.
Obrigado Ana, Obrigado Tiago!